Em meio à floresta nublada de Oaxaca, no sul do México, o destino ancestral habitado pelos povos das nuvens abriga a singular Casa Volta, projeto assinado por Jorge Ambrosi + Gabriela Etchegaray que faz uso de tijolinhos ressignificados em abóbadas para materializar uma arquitetura que sublinha a relação sem fronteiras entre ser humano, meio ambiente e temporalidade
Texto_André Rodrigues
Fotografias_Sergio López & Jaime Navarro
No idioma Nāhuatl (náuatle, em português) – a língua cantada pelos fabulosos Astecas no século 16, à época em que os colonizadores Europeus tomaram de assalto a América Central –, Oaxaca significa “platô das leucenas”: vegetação endêmica, leguminosa, perene, palatável e de elevada resiliência à seca. Essa região que desemboca no Pacífico (daí o interesse geopolítico dos invasores) até hoje abriga o que restou dos indígenas inaugurais mexicanos, entre eles os Mixtecas e Zapotecas (auto-proclamados Ben ‘Zaa: os povos das nuvens). Distante do ocultismo e dos enigmas não-solucionados por Indiana Jones (os conhecimentos sobre arquitetura e engenharia dessas civilizações validam a pergunta: eram os deuses astronautas?), o nome deriva da condição topográfica peculiar, às margens da Linha do Equador – um caldeirão quente e úmido –, que abriga algumas das principais florestas nubladas do planeta. Em meio à essa viagem quase-miragem que remixa vapor d’água com raríssimas aves endêmicas, três imensas estruturas abobadadas erguidas em tijolinhos aparentes parecem levitar num jogo de esconde-e-revela que emerge das copas das árvores. Projeto assinado pelos arquitetos Jorge Ambrosi e Gabriela Etchegaray, a Casa Volta se localiza numa clareira, apresentando-se, em certa medida, como se fosse o arquétipo de um templo antigo, digno de um rasante do Quetzalcóatl – o lendário pássaro-serpente feito de raios e trovões.
Avessa aos contos de fadas, os 120 metros quadrados da Casa Volta seguem a cartilha de regras de Louis Kahn, com um plano retangular subdivido em seis outras áreas alternativas no mesmo formato: três pátios abertos e três espaços cobertos. Os quartos e banheiros se situam em dois desses espaços que acionam montantes elaborados em madeira e junco, enquanto a cozinha e a área social estão fincadas no terceiro prédio, este sempre aberto ao mundo exterior. No centro das atenções, a água, elemento onipresente que evoca o mar – mesmo não podendo ser visto daqui, ele fica a menos de 100 metros de distância. As circunstâncias definem a materialidade do projeto: ali perto fica a Fundación Casa Wabi, obra-prima de Tadao Ando, vencedor de um Pritzker, em que também atuaram Gabriela e Jorge. A partir disso surgiu a ideia de alocar tijolos antes designados para uso em fornos de alta temperatura nas olarias sobre uma estrutura de concreto pigmentada na cor da argila. As abóbadas, junto às ripas de junco, fazem com que o vento sopre em profusão nas metragens mais restritas, enquanto a água se encarrega de moderar a temperatura nas áreas em conexão com o mundo exterior. “A Casa Volta é prova concreta de que um relacionamento equilibrado entre arquitetura e natureza pode ser atingido por meio de elementos bem pensados, e que a ordem construtiva não está em aparente desacordo com os seus arredores – pelo contrário: os dois podem se misturar de forma harmoniosa. A casa também serve de lembrança de que a simplicidade sempre será elegante. Mais do que uma casa, essa construção é um fragmento da civilização que ocupa o meio da selva”, finalizam Ambrosi e Etchegaray.
@ambrosietchegaray





